Por João Bugalhão
Não escondo que
nasci pobre numa das encostas da
serra de Marvão. Nunca andei descalço, mas vivi mais pobre que muitos daqueles
que hoje se dizem ou apelidam de “pobres” com carros à porta, refeições fornecidas por uma instituição, internet, Tv paga, etc.. Não tínhamos electricidade,
televisão, nem tão pouco telefonia, brincávamos com cavalos de pau, bolas de
farrapos que metíamos numa qualquer meia rota, matávamos pássaros com fisgas,
fazíamos corridas de burros, só tomávamos banho no verão nos tanques da
vizinhança, e roubávamos fruta nas hortas quando chegava o verão. Não íamos à
missa, ou pelo menos eu não ia, nem no natal. Mas aprendíamos a lutar pela vida porque ninguém nos dava nada, e o culto da malandragem não era muito apreciado ou incentivado e apoiado.
Nesse tempo não
se falava do pai natal com o saco das prendas vindo do pólo norte, num trenó
puxado por renas. Havia, isso sim um sapatinho, às vezes roto, que púnhamos à
chaminé na esperança que, pela manhã, lá aparecesse, deixado por um tal menino
jesus um par de meias, ou umas “joaninhas” de chocolate que custavam
meia-tostão e que ajudavam a aumentar as já adiantadas cáries dentárias. Uma ou
outra vez, também por lá aparecia uma fatia de queijo flamengo, ou meio pacote
de leite em pó ofertados pelo prior da paróquia que, dias antes dessa data, se
encarregava de o distribuir pelas progenitoras dos gaiatos pobres da freguesia
e, ao qual, meu pai chamava jocosamente o
leite do padre, que ajudava a tingir o triste café preto nas manhãs do dia
natal. Mas éramos felizes às vezes, como todas as crianças.
Não conhecia por
isso as histórias dos tradicionais reis magos que, o senhor deus, encarregou de
levar as prendas a seu filho humano, a não ser através dumas figurinhas de
barro que os meninos mais abastados, ou na escola, punham no meio do musgo,
juntamente com outras figuras ainda mais bizarras, onde se reuniam santos e animais, a que chamavam presépio. Muito
menos conhecia os seus nomes como hoje sei: Melchior ou Belchior que ofereceu o
ouro, talvez por ser branco ou seu representante, logo o mais rico. Gaspar, que
ofereceu o incenso, talvez por ser amarelo e julgar-se já um chinês
espiritualista. E Baltazar que, por ser preto, se contentou em ofertar “mirra”.
Coisas da cabeça dos homens, pois não me parece que um deus, e por ter mais que
fazer, alguma vez pensasse nisso.
Mas também não
havia estórias tristes como as duas que hoje vos conto, a troco destas coisas
do natal. Um natal mercantilista, de interesses, da caridadezinha, do faz de
conta que sou cristão e tenho que praticar o bem nesta época do ano! Mas o que
pretendem, no fundo, é a compra da consciência daqueles que, coitados,
continuam pobres ou apelidados de tal, para que, quando chegar o dia das
próximas eleições, os reembolsem com o seu votozinho
de agradecimento. É a estratégia: toma lá um “chupa” agora, dá-me lá um voto
naquele dia!
São assim as
estórias dos “vouchers”(vales-oferta), com que o Melchior
da autarquia de Marvão presenteou as criancinhas filhas dos funcionários da
autarquia. Curioso é que, os tais “vouchers” de 25 paus cada um, para comprar um brinquedo não possam, ao menos, ser gastos nas lojas
do concelho, que as há. Mas que levem logo a direcção (e o carimbo) para serem
aviados numa superfície comercial em Portalegre, no caso o hipermercado E. Leclerc. A pergunta básica que há a fazer é: será através de medidas como esta que o Melchior
(ou Belchior) marvanense pensa contribuir para o desenvolvimento da economia
local? Ou então, porque é que o virtuoso “mago”
não agarra em toda esta massa, e promove o tradicional almoço/jantar convívio
de todos os funcionários e colaboradores autárquicos, como sempre se fez antes
do seu reinado, que contribuiria para fortalecer o espírito de grupo! E,
preferencialmente servido por um Restaurante do concelho?
São assim também
as estóreas da entrega de cabazes de natal, que um tal deus norte alentejano
(Rui Nabeiro), em boa hora, e certamente bem-intencionado, resolveu ofertar os
mais desfavorecidos das terras em que tivesse paróquia a sua religião
(Delegação da Delta). O que ele não sabe, nem sonha, é que um certo mago Gaspar marvanense, não amarelo mas
cinzento, de quem se diz querer ocupar o lugar de Melchior, se presta, numa
estratégia do vale tudo, a fazer as figuras que em baixo se reproduzem (com
todo o respeito daqueles que foram bafejados pela sorte de serem os
escolhidos), posando quase como se também fosse um pobrezinho, na companhia dos
anjinhos camponeses (enviados pela Delta), para as fotos que a seguir mandou
publicar no faceboock do município! Pergunto: será que a autarquia não tem técnicos da área social para fazerem este
trabalho e tem de recorrer a um qualquer Gaspar
para esta tarefa? Ou mais uma vez o que está em causa é a promoção eleitoral do
figurante? Será que um vereador, pago a preço de incenso, não tem mais nada
para fazer?
Finalmente, que
restará ao 3º mago, Baltazar o rei preto, a quem calhará neste caso, não ofertar
“mirra”, mas certamente a fava! Possivelmente cantar as janeiras quando chegar
o dia 6 do primeiro mês do 2016!
Os tais vouchers que desviam dinheiro deste concelho, para um concelho vizinho, Mas é no concelho de Marvão que eu e muitos pagamos impostos. Mas o proprietário do E. Leclerc deve estar muito agradecido.
ResponderEliminarMeu caro Bruno, e quem sabe se "os próximos" do tal Melchior, há coisas que, se não são..., quase parecem. Ou quando os actos estão tão longe das palavras bonitas que determinados políticos pronunciam!
EliminarEntretanto, pessoas como tu e família, que têm a coragem de continuar a investir e a criar postos de trabalho no concelho, definham. Mas é com atitudes como a que ontem tiveste, no local próprio dizer as verdades (Reunião de Câmara), que algumas "magos" têm que arrepiar caminho. Só espero que o pedido de desculpas chegue para ti, e para os marvanenses em geral, que isso também prejudica os restantes residentes.
Bom Natal Bruno Moura, e restante família...
Obrigado Sr. João, desejos também de Bom Natal.
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