quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Pequenas histórias e vivências da comunidade marvanense (1)

Por João Bugalhão

A partir de agora, e com alguma regularidade, aqui irei publicar pequenas histórias da vida marvanense, não obedecendo a qualquer ordem cronológica, e sem qualquer pretensiosismo de historiador, apenas e só o tentar dar a conhecer acontecimentos e factos do passado e estimular à sua análise. Podem ser acontecimentos históricos como o de hoje, mas podem ser apenas pequenas intervenções individuais e ocasionais na nossa vida comunitária. Isto poderá parecer básico para os especialistas, mas para o comum dos marvanenses poderá trazer algum conhecimento, e quem sabe, suscitar algumas dúvidas e estimular o estudo mais aprofundado, para além de poder provocar o contraditório. Se assim for terá valido a pena. Para começar, e porque por estes dias se celebra, no próximo dia 24 de Janeiro, mais uma data da restauração do concelho em 1898, aqui publicamos alguns episódios que antecederam essa data, mais propriamente alguns factos sobre essa integração do concelho de Marvão no de Castelo Vide. 


É mais ou menos do conhecimento geral dos marvanenses que o concelho de Marvão esteve adstrito ao concelho de Castelo de Vide nos finais do século XIX durante cerca de 2 anos, mais propriamente entre Outubro de 1895 e Janeiro de 1898. Já lá vão cerca de 120 anos. Desde então, Marvão é um dos 308 municípios de Portugal, sendo que 278 encontram-se sedeados no continente e os restantes 30 nos arquipélagos da Madeira e Açores.

O concelho de Marvão, um dos mais antigos e importantes de Portugal, foi suprimido por “Decreto” do governo central, como muitos outros no país nessa altura. No distrito de Portalegre, para além de Marvão, também foram suprimidos na mesma altura, Monforte, Gavião e Sousel. Diversas são as razões apontadas para estas extinções, mas na sua origem parecem estar razões de âmbito nacional, que foram, basicamente, duas: as dificuldades económicas do país e a falta de gestores ou administradores locais competentes.

No caso específico de Marvão, são escassas as fontes sobre as razões da sua integração no Concelho de Castelo de Vide. Hoje trago aqui 3 informações que poderão justificar essa integração, e pelas razões que em cima referi:

A primeira, de acordo com Maria Ana Bernardo (1), diz respeito ao que encontramos na última Acta de sessão camarária antes da integração, realizada em 5 de Setembro de 1995, parece que apenas motivada para se fazer uma representação de petição ao rei D. Carlos: “...pedindo concessão da entrada no concelho de pão vindo de Espanha. O mau ano agrícola resultara na escassez de cereais panificáveis e, para a vereação em funções, só a autorização régia para que cada pessoa pudesse trazer do país vizinho pelo menos 10 quilos de pão ajudaria a resolver o problema. Presentes nessa sessão estavam indivíduos que faziam parte da administração quando da extinção do concelho: Dr. António de Mattos Magalhães (presidente), Manuel Rodrigues Pinheiro (vice presidente), José Maria Forte, José Serra Júnior e Francisco Rosado (vereadores)."

Nessa época para além da vereação camarária existia um Administrador nomeado pelo poder central. É ele que, em ofício dirigido ao Governador Civil datado de 1 de Outubro de 1895, e registado no livro da correspondência expedida, nos dá também conta das mesmas dificuldades económicas. Mas mais que isso, também se queixa da falta de responsabilidade da administração camarária mesmo antes da integração, quando diz: “...há já três meses que eu e os empregados d´esta administração não recebem os seus vencimentos, dizendo o secretário da câmara que não se pagava em vista das folhas não estarem feitas e não haver aqui quem as assignassem. Espero que V. Ex.ª se digne providenciar porquanto poderá avaliar o grave transtorno que este facto ocasiona principalmente n´este momento, havendo em cofre da câmara a quantia não inferior a um conto de reis.” (2)

Para além destas duas citações, de acordo com a mesma autora pouco mais se pode apurar documentalmente e, nem uma nem a outra, fazem qualquer referência à integração próxima. Tal, digamos, é no mínimo estranho!

Mas se tal facto parece querer ser ignorado pelos de Marvão, já o mesmo não se pode dizer pelos integradores de Castelo de Vide, e em Acta de sessão extraordinária do dia 1 de Outubro de 1895, o presidente castelovidense, Pinto de Sequeira Costa, deixou lavrado o seguinte: “...tendo o Diário do Governo do dia trinta de Setembro último publicado o Decreto do dia 26 do dito mez a reforma da circunscrição administrativa do distrito de Portalegre, sendo classificado em segunda ordem o concelho de Castello de Vide, anexando-se-lhe o concelho de Marvão e resultando d´este facto um grade melhoramento que a todo este município deve satisfazer, entendi dever convidar os meus collegas, para em sessão solene e especial comemorarmos este acontecimento e significarmos o nosso reconhecimento a todos os que contribuíram para tão grande benefício.” (3)

Durante os dois anos e três meses que durou a anexação, segundo a autora que vimos citando, não foram encontrados documentos, nem em Marvão nem Castelo de Vide, que relatassem quais protestos ou desacatos pela integração de Marvão no Concelho de Castelo de Vide, nem dos dirigentes nem das populações. Também não foram encontrados relatos escritos de quaisquer actos heróicos que levassem à restauração do concelho em 24 de Janeiro de 1898. Se os houve, não se escreveram! Se se anexou por decreto, por decreto, governamental, se restaurou. Em conclusão silêncio de uns, exaltação de outros. Outras histórias se contam, mas essas ficam para outra ocasião!

(1) – BERNARDO, Maria Ana: Centenário da Restauração do Concelho de Marvão , 1998, pg 14.

(2) – Idem, pg 15

(3) – Idem, pg 16 
       

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