domingo, 24 de janeiro de 2016

Pequenas histórias e vivências da comunidade marvanense (3)

Por João Bugalhão

...e porque hoje é dia 24 de Janeiro!

Se a integração do concelho de Marvão em Castelo de Vide em 1895 foi uma coisa boa ou não, será algo que nunca saberemos. Possivelmente, como tudo na vida, seria uma coisa boa para uns e prejudicial para outros. O que nos fica da narração que vos venho fazendo, e do que ficou escrito, parece que para os de Castelo Vide seria bom, já para os de Marvão não o sabemos porque são poucos os relatos. Mesmo assim, não podemos esquecer que esses relatos são dos dirigentes da altura, e como sabemos, pela experiência da vida, nem sempre o que é bom para os dirigentes é o que é bom para o povo que dizem representar.

No caso de António de Mattos Magalhães, não sabendo nós, se por estes feitos se por outros, haveria de chegar a Par do Reino/Deputado, através da promoção do seu amigo Frederico Laranjo. Esta situação não impediu no entanto de ser considerado um dos grandes beneméritos do concelho, contribuindo às suas expensas para a construção de algumas obras públicas, nomeadamente escolas. Uma das mais curiosas é que consta na sua biografia da Câmara Municipal de Marvão, sobre as então importantes Termas da Fadagosa e que diz “Não tendo a Câmara Municipal disponibilidade financeira para custear a exploração das águas, nem verbas para custear as despesas do projecto de reedificação dos referidos banhos, deliberou em sessão de 4 de Outubro de 1885, que estas águas se vendessem em hasta pública, arrematando-as então o Dr. António de Mattos Magalhães.” 


Figura 1 - Fotografia de Marvão no início do século XX (Retirada do álbum do Facebook de Jorge Oliveira)


Outra ilação que podemos tirar desses tempos, independentemente das vantagens que se poderiam ter no cômputo nacional com a integração (ganhar força de escala), é que a anexação de uns por outros nem sempre será a melhor coisa. Cada comunidade tem as suas vivências, o seu orgulho, e sobretudo a sua história. Não será por mero acaso do destino que, há mais de 800 anos, existem aqui 2 concelhos e duas comunidades diferenciadas. Contrariar a história e a tradição não será nunca uma boa estratégia.

Voltando ao cerne da nossa narrativa, ficou assim o dia 24 de Janeiro de 1898 gravado na história de Marvão, como o dia da “restauração do concelho”, chegando a ser considerado feriado municipal. Das comemorações próximas dessa data, pouco se sabe.  Mas uma das que se sabe é que, 36 anos depois (!) em 1934, já em plena primavera salazarista, a coisa continuava a ser lembrada e comemorada pelos de Marvão, e então de uma forma épica como nunca nos tinha sido relatada. Atente-se no exemplo do discurso que fez, e deixou escrito, José Domingos de Oliveira, presidente da Comissão Administrativa da Câmara municipal de Marvão no dia 24 de Janeiro de 1934:



Foto de José Domingos Oliveira

Discurso retirado da Obra Centenário da Restauração do Concelho de Marvão da Autoria de Maria Ana Rodrigues Bernardo, pgs 33 e 34.


Hoje, passados 118 anos, embora com menos fulgor, a data continua a ser comemorada em Marvão, uns anos com mais entusiasmo outros nem por isso, como parece ser o caso deste ano. Perante os factos que vos citei tenho algumas dúvidas acerca da implicação dos marvanenses, sobretudo dos seus dirigentes, na desanexação/restauração do concelho de Marvão em 1898. O episódio mais parece um daqueles equívocos dos governantes centrais que fazem e desfazem com facilidade por decreto, o que antes outros haviam feito.  Se assim foi, os motivos para comemorar actos heróicos serão poucos, por isso as comemorações foram sempre tão fracas.

 No entanto, este episódio deve merecer a nossa reflexão nos dias de hoje, já que a história muitas vezes se repete como um círculo. Tenho dúvidas, nos tempos que correm, se a independência administrativa e financeira dos 2 concelhos (senão até mais alargada) se poderá manter por muito mais tempo com o despovoamento constante, impossível de parar, que os 2 concelhos têm sofrido; é que actualmente, juntos, não chegam aos 7 mil habitantes (só Marvão em 1971 tinha perto de 8 mil).  Já escrevi que sou favorável a uma “federação”, com uma só administração, constituída por Marvão, Castelo de Vide, Portalegre, Arronches e Monforte; mas com cada um dos concelhos a manter a sua identidade e representação democrática nessa administração. 

Anexação de uns pelos outros nunca! Olhemos para a história... 


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