Por Teresa Simão
(1940-2016)
Em plena era digital,
em que a informação circula quase à velocidade da luz, nem sempre as notícias
que recebemos são as mais agradáveis. Ao abrir o computador e passar os olhos
pelo F.B., eis que me deparei com um laço negro apresentado pelo Rancho Folclórico
da Casa do Povo de Santo António das Areias que me despertou a atenção e me
levou a tentar perceber o que se passara na nossa terra que tal motivava. Assim
tive acesso à triste notícia da partida deste marvanense que tanto contribuiu
para a preservação da identidade da nossa gente e do Alentejo em geral.
Há alguns anos atrás, quando iniciei a minha linha de investigação sobre o património imaterial de Marvão, João Nunes Vidal foi uma das primeiras pessoas a que me dirigi, pois sempre o tive como uma referência na recolha etnológica do concelho de Marvão e há muito que ia acompanhando o seu trabalho. A receção não poderia ser melhor, quer da sua parte, quer por parte da sua família. Todos se disponibilizaram para me fornecer o que fosse necessário e ali senti estar na presença, mais do que meros informantes/colaboradores, de novos amigos. E foi assim, com base em algumas letras de músicas do Rancho Folclórico da Casa do Povo de Santo António das Areias, que começou o estudo do Falar de Marvão, que depois viria a contar com o apoio de muuuuitos mais marvanenses e também da minha experiência, pois tenho a sorte de estudar algo que me é muito caro.
Ao saber da partida do Sr. Vidal, ainda por cima no dia em que completava 76 anos de idade, imediatamente me deixei abater pela natural tristeza inerente à perda de um grande Homem. No entanto, em seguida, comecei a recordar o dia em que o conheci pessoalmente, as conversas que com ele tivera e, acima de tudo, tudo o que contribuiu para a cultura alentejana, e de Marvão muito em particular, e logo me veio à memória a sua cara de menino, que irradiava alegria sempre que falava que assuntos de cariz etnológico e perante a qual ninguém podia ficar triste, mas sim curioso e entusiasmado com o seu saber contagiante.
Marvanense de gema, descendente de uma família já com veia para a música, o afastamento temporário do concelho por questões profissionais nunca apagou as suas origens nem o gosto pela cultura popular que desde tenra idade lhe foi incutido. Logo que lhe surgiu um desafio, deu largas à sua criatividade e, através de muito trabalho e muita dedicação, conseguiu impor-se como uma referência no domínio da etnologia.
Em 2009, por ocasião da atribuição da Medalha de Mérito Municipal de Marvão ao Sr. João Nunes Vidal, o amigo Pedro Sobreira (na altura vice-presidente da autarquia) escreveu uma excelente síntese biográfica que aqui partilho, pois permite ao leitor conhecer um pouco melhor o nosso conterrâneo:
http://vendoomundodebinoculosdoaltodemarvao.blogspot.pt/2009/09/joao-vidal-o-homem-e-obra.html
“o sonho comanda a vida,
(…) sempre que um
homem sonha
o mundo pula e
avança”
Ao relembrar as
palavras sábias de António Gedeão (que tantas vezes me servem de alento), não
posso deixar de definir o Sr. Vidal como um sonhador que muito lutou para
realizar os seus projetos e que conseguiu o merecido sucesso pelo seu trabalho,
prestando assim um enorme contributo a todas as terras e a todas as gentes
que, graças a si, viram as suas tradições, os seus usos e costumes, bem como as
suas músicas populares recolhidas e promovidas, de modo a não caírem
definitivamente no esquecimento, mas passarem de geração em geração e assim
perdurarem no tempo.
Como sempre se
disponibilizou a partilhar a informação por si coligida, aqui deixo um link
para uma recolha feita pelo projeto Memoriamedia, no qual o Sr. Vidal apresenta
alguns dos seus registos:
http://www.memoriamedia.net/GFCB-docs/DOCUMENTOS/Recolhas-Sr-Vidal.pdf
http://www.memoriamedia.net/GFCB-docs/DOCUMENTOS/Recolhas-Sr-Vidal.pdf
Alerto ainda para a
leitura do artigo por si escrito na revista Ibn
Maruán nº 1 (p. 67), intitulado “Ritos de Passagem do Nordeste de S. Mamede”,
presente em: http://www.cm-marvao.pt/pt/revista-cultural-ibn-maruan
Até ao momento, muito
do trabalho do saudoso Sr.Vidal tem sido acarinhado e promovido por aqueles que consigo lidavam
mais de perto, sendo o Rancho Folclórico da Casa do Povo de Santo António das Areias um dos
principais mentores. Esperemos que assim continue e que alguns conteúdos que ainda
existam no seu baú venham a público e possam continuar a enriquecer-nos a todos,
pois essa seria seguramente a sua maior alegria!
Sem comentários:
Enviar um comentário